Os símbolos que envolvem os altares para a Santa Missa não são meros objetos decorativos, mas representações de uma realidade misteriosa, da qual somos chamados a participar pela Sagrada Liturgia.

 

D esde as mais remotas épocas da História, os homens procuraram perscrutar um mundo envolto no mistério, onde se afigurava a Divindade merecedora de reverência. Sentiam eles necessidade de prestar culto a Deus, mas o faziam de modo imperfeito, pois buscavam o Criador “às apalpadelas” (At 17, 27).

Na plenitude dos tempos, Nosso Senhor Jesus Cristo quis viver entre os filhos de Adão e Se entregou em sacrifício para abrir-lhes as portas do Céu. Em todos os seus gestos, palavras e orações, o Cordeiro sem mancha oferecia enquanto Homem o que merecia como Deus: o louvor perfeito.

Esse louvor, contudo, não se encerrou com sua Ascensão aos Céus, mas continua íntegro e perene na Sagrada Liturgia, através da qual o próprio Cristo “vive sempre na sua Igreja e prossegue o caminho de imensa misericórdia que iniciou nesta vida mortal”.[1]
O que significam, pois, os gestos e palavras do Bom Jesus reproduzidos pela Santa Mãe Igreja, na Sagrada Liturgia?

Eis o tema que queremos desenvolver neste artigo, a partir de uma visão simbólica dos ornamentos que revestem os altares para a Santa Missa: a toalha, a cruz, as velas e as flores.

Sudário que envolve o Corpo de Cristo

Sobre todos os altares preparados para a Santa Missa, é colocado um tecido alvíssimo, memorial do “Sudário e outros linhos com os quais foi envolto o Corpo do Salvador, representado pelo altar”.[2]

Os primeiros cristãos já tinham o costume, provavelmente herdado dos romanos, de recobrir com um tecido a mesa da celebração. Entretanto, por volta do século VIII, a devoção e o zelo pelo Santíssimo Sacramento inspiraram a Igreja a usar não apenas uma, mas duas ou mais toalhas. “Foi neste período que a toalha superior, a qual recebia o Corpo de Cristo, passou a ser chamada palla corporalis, ou simplesmente corporal[3] e começou a tomar a forma que hoje conhecemos.

Por sua proximidade do Santíssimo Sacramento, o corporal tornou-se objeto de veneração superior à das relíquias dos Santos. Durante a Idade Média, reputava-se ter ele uma eficácia sobre-humana contra incêndios e doenças. E, em muitas igrejas, o sacerdote se dirigia ao público depois da Missa para lhes tocar a face com o corporal, a fim de protegê-los das enfermidades da vista.

Além do Sudário e demais tecidos da sepultura do Salvador, as toalhas do altar simbolizam os membros da Igreja que circundam o Supremo Rei Ressuscitado, quais preciosas vestes, segundo canta o Salmo: “O Senhor é Rei e Se vestiu de majestade” (Sl 92, 1). Os membros do Corpo Místico espalhados pelo mundo inteiro são as vestes de que Cristo quis revestir-Se!

A árvore da vida no centro do Paraíso

Durante a Santa Missa um crucifixo é disposto diante do sacerdote, normalmente em cima do altar, para ressaltar a união entre este ato e o Holocausto de Cristo no Calvário. Um só é o Sacrifício de Cristo, renovado por seus ministros em cada Celebração Eucarística.

Embora seja incerto o momento em que tal uso se tornou oficial em todo o orbe, já no século V alguns ritos orientais o adotaram. No Ocidente, porém, o costume é mais tardio: apenas por volta do século XI tornou-se comum nas igrejas de Rito Latino. A presença desse ornamento durante a celebração da Missa provavelmente teve sua origem nas cruzes que precediam as procissões estacionais, cuja haste podia ser retirada, permitindo depositá-las em pé sobre o altar.

Analisando os significados dessa insígnia nas celebrações versus populum, Bento XVI afirma: “A cruz do altar não é um obstáculo para ver-se, mas o ponto de referência comum. […] É, para todos, a imagem que recolhe e une os olhares. […] Dessa maneira, fica clara a diferença entre a Liturgia da Palavra e o Cânon. Enquanto a primeira é pregação e, em consequência, atenção direta, o segundo é adoração comum na qual, hoje como ontem, rezamos: conversi ad Dominum, voltemo-nos para o Senhor”.[4]

Crucifixo – Paróquia São Pedro Apóstolo, Montreal (Canadá)

A Sagrada Liturgia também acolhe o simbolismo legado pelos Padres da Igreja: a analogia entre o lenho da Cruz e a árvore de cujo fruto comeram nossos primeiros pais, e que lhes mereceu a expulsão do Paraíso Terrestre.

De uma árvore caiu a maldição sobre o homem desobediente, mas de outro Madeiro incomparavelmente mais belo, Deus fez germinar a remissão dos pecados e a salvação. A Cruz é, pois, a fonte da vida eterna que jorra de modo superabundante na Sagrada Eucaristia, e a verdadeira árvore da vida de que nos fala o Livro do Apocalipse: “Ao vencedor darei a comer da árvore da vida, que está no Paraíso de Deus” (2, 7).

Luz que ilumina o mundo inteiro

Ao lado do crucifixo, os castiçais e as velas adornam os altares com uma luz discreta, solene e bruxuleante. Muito além de uma razão prática de iluminação, a Santa Igreja vê nestes simples objetos “a imagem d’Aquele que é a Luz da Luz, a Luz do mundo, o Sol de Justiça, Jesus Cristo”.[5]

Nas discretas chamas que alumiam os altares, estão representadas “suas palavras luminosas, sua graça redentora, seu amor consumado no Sacrifício do Calvário”.[6]

Por outro aspecto – não menos dotado de beleza e profundidade –, as velas simbolizam nossa fé, nossa esperança e nosso amor, virtudes que conduzem à luz de glória da Igreja Celeste, “que não tem mais necessidade de Sol nem de Lua que a iluminem, porque a glória de Deus a ilumina, e o seu luzeiro é o Cordeiro” (Ap 21, 23).

Quanto à sua história, sabemos que apenas “na primeira metade do século XI, se começa a depositar os candelabros sobre o altar”.[7] Antes se costumava deixá-los em terra, diante deste.

Singelo símbolo das glórias do Deus Crucificado

Bela pela variedade, delicadeza e simplicidade, também a natureza vegetal glorifica o Redentor com seus deslumbrantes coloridos e suaves perfumes.

Seguindo uma “antiquíssima tradição da Igreja”,[8] os cristãos oferecem rosas e lírios para enfeitar os altares, simbolizando a alegria e “o bom odor das virtudes, das quais o Divino Redentor, representado pelo altar, é o dispensador”.[9]

Sendo costume dos antigos ornar os túmulos dos falecidos com flores, tal praxe foi piamente transportada para o interior das igrejas, cujos altares serviam de custódias para as relíquias dos mártires.

De outra parte, a Igreja encontrou nas pétalas de rosa um “símbolo expressivo das línguas de fogo e dos dons do Espírito Santo”,[10] razão pela qual a Solenidade de Pentecostes é chamada na Itália de Pasqua Rosata – Páscoa das Rosas. E nas regiões mais setentrionais, onde não havia palmas para celebrar o Domingo de Ramos, as flores tomavam seu lugar para glorificar a realeza de nosso Salvador e exaltá-Lo como Triunfador por todos os séculos.

 

Nada surge na Igreja de modo artificial

Ao analisar esses aspectos da História da Liturgia pudemos constatar com edificação como a Igreja, Corpo Místico de Cristo, foi lentamente – ou melhor, solenemente – crescendo e se fortalecendo em espírito (cf. Lc 1, 80) ao longo dos séculos.

Nada nesta instituição sagrada surgiu de maneira artificial. Cada um de seus costumes, adornos, ritos ou cerimônias possui uma história riquíssima, transcendente e, por vezes, até emocionante, e o altar não poderia ser uma exceção! Afinal, ele constitui uma espécie de porta que se abre, na terra, para o Céu, pois sobre ele, a cada dia, Deus desce do Paraíso a fim de conviver com os homens.

Assim, os objetos que circundam imediatamente ao altar são os adornos que o próprio Deus escolheu para rodeá-Lo quando Ele Se apresenta diante de seus filhos. 

 

Notas

[1] PIO XII. Mediator Dei: DH 3855.
[2] BARIN, Luigi Rodolfo. Catechismo liturgico: Corso completo di Scienza Liturgica. Liturgia fondamentale. 9.ed. Rovigo: Istituto Padano di Arti Grafiche, 1945, v.I, p.225, nota 2.
[3] RIGHETTI, Mario. Manuale di Storia Liturgica. 3.ed. Milano: Àncora, 2005, v.I, p.532.
[4] RATZINGER, Joseph. La fiesta de la fe: ensayo de Teología Litúrgica. 3.ed. Bilbao: Desclée de Brouwer, 1999, p.193-194.
[5] JAKOB, Georg. Die Kunst im dienste der Kirche. Ein Handbuch für freunde der kirchlichen Kunst. 5.ed. Landshut: J. Thomann, 1901, p.189.
[6] Idem, ibidem.
[7] RIGHETTI, op. cit., p.542.
[8] Idem, p.544.
[9] BARIN, op. cit., p.229.
[10] RIGHETTI, op. cit., p.545.

 

Artigo anteriorSanta Odila da Alsácia – Cega para si, águia para Deus
Próximo artigoEspectadora da História, palco de dores e glórias

1 COMENTÁRIO

  1. Salve Maria!
    Muito interessante este artigo sobre o significado dos objetos e oferendas no altar da Sagrada Eucaristia.
    Tenho curiosidade em saber o que significaria aquela cobertura (tipo guarda sol) em tom amarelo que vemos em muitos altares de igrejas, como na Basílica Velha de Aparecida?

Deixe um comentário para pedroricciardi58@hotmail.com Cancelar resposta

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui